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29 de junho de 2010

como a vida pode ensinar sobre os processos de gestão

Como é que o indivíduo, especialmente aquele que está empregando conhecimento no trabalho, pode se tornar eficaz, e como é que pode permanecer eficaz durante longos anos, em períodos de mudança, com o passar dos anos de trabalho e dos anos de sua vida?

Uma vez que esta pergunta trata do indivíduo, talvez seja adequado falar de minha própria experiência. Começarei falando de sete experiências em minha vida que me ensinaram como eu poderia me manter eficaz, capaz de crescer e de mudar - e capaz de envelhecer sem me tornar um prisioneiro do passado.
Eu ainda não tinha 18 anos de idade quando, tendo concluído o segundo grau, saí de Viena, na Áustria, minha terra natal, e fui para Hamburgo, na Alemanha, como trainee em uma empresa de exportação de algodão. Para tranqüilizar minha família, mas sem qualquer intenção séria eu me matriculei também na faculdade de Direito da Universidade de Hamburgo.

Naquela época, 1927, na Áustria ou na Alemanha, um estudante universitário regularmente matriculado não precisava freqüentar aulas. Bastava obter assinaturas dos professores nos livros de chamadas. Para isso, não era necessário assistir às aulas. Simplesmente dava-se uma gorjeta ao bedel da faculdade que então, procurava os professores e pedia suas assinaturas.
O trabalho como trainee era extremamente desinteressante, e eu pouco aprendi. Começava às 7:30 hs e terminava às 16:00 hs e, aos sábados, às 12:00 hs. Assim eu tinha muito tempo livre. Durante a semana, eu ia todas as noites à Biblioteca Municipal de Hamburgo e, durante quinze meses eu li continuamente em alemão, inglês e francês.

1-Meta e Visão - Verdi 

Uma vez por semana, eu assistia a apresentações de óperas. Eu tinha pouco dinheiro, pois os trainees não recebiam pagamento algum, mas os estudantes universitários podiam assistir a óperas de graça (se sobrassem cadeiras). Em uma dessas noites, fui ouvir uma ópera do grande compositor italiano do século XIX, Giuseppe Verdi - a última ópera que ele compôs em 1893, Falstaff.
Embora tivesse ouvido muitas e excelentes óperas, nunca ouvira nada igual a Falstaff. Eu nunca me esqueci da impressão que aquela noite me causara.
Quando fui pesquisar, descobri, para minha grande surpresa, que essa ópera, com sua alegria, entusiasmo pela vida, e sua incrível vitalidade, fora escrita por um homem de 80 anos de idade. Naquela época, esta não era uma idade comum. Então li o que o próprio Verdi havia escrito, quando lhe perguntaram por que, com sua idade, um homem famoso e considerado um dos maiores compositores de ópera do século XIX, tinha assumido a árdua tarefa de compor mais uma ópera difícil demais de ser interpretada. "Durante toda a minha vida como músico lutei para atingir a perfeição. Ela sempre me escapou. Certamente eu tinha a obrigação de tentar mais uma vez".

Nunca me esqueci dessas palavras - elas me influenciaram para sempre. Resolvi que qualquer que fosse minha carreira, as palavras de Verdi seriam meu guia e, se eu chegasse àquela idade avançada, não desistiria, mas prosseguiria. Enquanto isso, lutaria para atingir a perfeição, embora, como eu bem sabia, ela sempre me escaparia.

Fídias 

Foi nesse mesmo período e também em Hamburgo, que li uma história sobre o maior escultor da Grécia Antiga, Fídias. Ele foi incumbido, por volta de 440 a.C a fazer as estátuas que até hoje, 2400 anos mais tarde, ainda estão no teto do Parthenon, em Atenas, e são consideradas as maiores esculturas da tradição ocidental. As estátuas foram admiradas universalmente, mas quando Fídias apresentou a sua conta, o contador da Cidade de Atenas se recusou a pagá-la: "Estas estátuas estão no teto do templo e no monte mais alto de Atenas. Ninguém pode ver nada, exceto a parte frontal delas. No entanto, você está nos cobrando pela escultura toda, ou seja, por esculpir a parte de trás, que ninguém pode ver".
"Engano seu", Fídias retorquiu "os Deuses podem vê-las". Lembro-me de ter lido isso logo depois de ter assistido a Falstaff, e fiquei muito impressionado. Nem sempre segui as palavras de Fídias. Fiz muitas coisas que espero que os deuses não tenham notado, mas sempre soube que se deve lutar pela perfeição, mesmo que só "os deuses" sejam capazes de notá-la.

2-O Aprendizado Contínuo

Alguns anos mais tarde, mudei-me para Frankfurt, na Alemanha. No dia em que completei 20 anos fui contratado pelo maior jornal de Frankfurt como articulista na área de finanças e negócios estrangeiros. Continuei matriculado como estudante de Direito porque naquela época era fácil se transferir de uma universidade européia para outra. Ainda não me interessava por Direito, mas lembrava-me das lições de Verdi e de Fídias. Um jornalista precisa escrever sobre vários assuntos; decidi que tinha de saber algo sobre muitos assuntos para ser, pelo menos, um jornalista competente.
Como terminava o trabalho por volta de 14:00 hs, comecei a me empenhar para estudar às tardes e noites: relações internacionais e direito internacional; a história das instituições sociais e jurídicas; historia geral .... Gradualmente desenvolvi uma metodologia de estudo que ainda sigo. A cada 3 ou 4 anos escolho um tema e o estudo. Isto não só me deu uma base substancial de conhecimento, mas também me forçou a estar aberto a novas disciplinas, abordagens e métodos - pois cada um dos assuntos que estudei faz suposições diferentes e emprega uma metodologia diferente.

Revisão 

A próxima experiência a relatar nesta longa história em que procurei me manter intelectualmente vivo e crescendo foi a que eu aprendi com o editor-chefe do Jornal para o qual eu trabalhava.
O editor-chefe, com cerca de 50 anos, penava para treinar e disciplinar seus jovens jornalistas. Ele discutia com cada um de nós toda semana sobre o trabalho que havíamos feito. Duas vezes por ano, logo depois do Ano Novo e antes do início das férias de verão, em junho, passávamos a tarde de sábado e todo domingo discutindo nosso trabalho nos 6 meses anteriores. O editor sempre começava com as coisas que tínhamos feito bem. Em seguida revia as coisas em que não tínhamos nos saído muito bem. E, finalmente, ele nos submetia a uma crítica severa quanto ao que tínhamos feito incorretamente ou que não conseguimos fazer.Nas duas últimas horas daquela reunião, projetávamos nosso trabalho para os 6 meses seguintes: Em que deveríamos nos concentrar? Em que nos aperfeiçoaríamos? O que cada um de nós precisava aprender? E, uma semana depois, cada um de nós deveria apresentar um novo programa de trabalho e aprendizado para os seis meses seguintes.

Quase 10 anos depois, e já nos EUA, lembrei-me destas reuniões. Foi no início da década de 1940 que eu assumi como professor sênior em uma importante faculdade, comecei a dar consultoria e a publicar livros. Lembrei-me então do que o editor-chefe havia me ensinado. Desde então, tenho reservado 2 semanas todos os anos para revisar meu livro escrito no ano anterior, começando com o que fiz bem, mas que poderia ter feito melhor, e indo até o que não fiz bem e aquilo que deveria ter feito, mas não fiz. Estabeleço minhas prioridades no trabalho de consultor, de escritor e de professor.
Nem uma única vez consegui realmente seguir à risca o plano feito em cada mês de agosto, mas isso me forçou a tentar a proposição de Verdi de "lutar pela perfeição", embora "ela tenha sempre me escapado".

4-Competências Essenciais 

A experiência seguinte de meu aprendizado veio alguns anos depois. De Frankfurt, mudei-me para Londres em 1933. Trabalhei como analista de títulos de uma grande empresa de seguros e, um ano mais tarde, para um pequeno banco privado, como economista e secretário executivo dos 3 sócios. Depois de quase 3 meses de empresa, um dos sócios me chamou a seu escritório e disse: "Eu não esperava muito de você quando entrou aqui - e ainda não espero muito -, mas você é mais tolo do que eu pensei que fosse, e muito mais tolo do que tem o direito de ser". Em seguida, ele disse: "Entendo que você fazia análises muito boas de títulos na empresa de seguros. Mas se quiséssemos que você fizesse o trabalho de análise de títulos, o teríamos deixado onde você estava. Agora você é secretário executivo dos sócios e, no entanto, continua a fazer análise de títulos. O que você deveria estar fazendo agora para ser eficaz em seu novo emprego? " Fiquei furioso, mas percebi que ele tinha razão. Desde então, quando tenho uma nova atribuição, pergunto-me: "O que eu preciso fazer agora que tenho uma nova atribuição para ser eficaz?"
Por que as pessoas que, durante 10 a 15 anos, foram competentes, de repente se tornaram incompetentes? A razão em todos os casos que tenho visto é que as pessoas fazem o que eu fiz, 60 anos atrás, naquele banco em Londres. Elas assumem sua nova atribuição, mas continuam fazendo o que as tornou bem-sucedidas no antigo cargo e o que lhes valeu a promoção. Então, agem com incompetência, não por que se tornaram incompetentes, mas porque estão tomando as iniciativas erradas.

Jesuítas e Calvinistas

Por volta de 1945, já residindo nos EUA, resolvi estudar, durante 3 anos, a história moderna da Europa, em especial os séculos XV e XVI. Descobri que duas instituições européias tinham se tornado as forças dominantes na Europa: a Companhia de Jesus, no sul católico e a Igreja Calvinista, no norte protestante. Ambas deviam seu sucesso ao mesmo método de aprendizado.
Sempre que um padre jesuíta ou um pastor calvinista faz qualquer coisa importante, deve anotar os resultados esperados. Nove meses depois ele compara os resultados reais com o projetado. Logo, isso mostra o que ele fez bem e quais são os seus pontos fortes. Também mostra o que ele precisa aprender e quais os hábitos ele precisa mudar. Finalmente, revela também aquilo para o qual ele não tem talento e o que ele não pode fazer bem. Tenho seguido esse método há 50 anos. Conhecer as próprias forças, saber como aprimorá-las e saber o que não se pode fazer são as chaves para o aprendizado contínuo.

5-Pelo que se deve ser lembrado 

Mais uma experiência, e com ela encerro a história de meu desenvolvimento pessoal. No natal de 1949 meu pai, então com 73 anos, veio da Califórnia para me visitar. Logo após o Ano Novo, em 3 de janeiro de 1950, ele e eu fomos visitar um velho amigo dele, o famoso economista Joseph Schumpeter. Schumpeter, então com 66 anos e famoso no mundo todo, ainda lecionava na Harvard e era muito ativo como presidente da American Economic Association.

Em 1902 meu pai era um jovem funcionário público no Ministério das Finanças da Áustria, mas também dava aulas de economia na universidade. Ele conheceu Schumpeter, então com 19 anos, o mais brilhante dos jovens estudantes - os dois se tornaram amigos e mantiveram a amizade.
De repente, meu pai perguntou com um leve sorriso: "Joseph, você ainda fala pelo que quer ser lembrado?". Schumpeter caiu na gargalhada e até eu ri. Pois sabia-se que ele tinha dito aos 30 anos, mais ou menos, com os dois primeiros grandes livros de economia publicados, que ele queria ser lembrado por ter sido o maior amante de mulheres bonitas da Europa, e o melhor cavaleiro da Europa - e talvez também o maior economista do mundo. Schumpeter disse: "Sim, esta pergunta ainda é importante para mim, mas agora a resposta é diferente. Eu quero ser lembrado por ter sido o professor que converteu meia dúzia de estudantes brilhantes em economistas de primeira classe". E continuou: "Sabe de uma coisa, Adolph, agora cheguei à idade em que sei que ser lembrado por livros e teorias não basta. Ninguém se destaca a não ser que faça diferença na vida das pessoas". Schumpeter morreu 5 dias depois de nossa visita.

Nunca me esqueci daquela conversa. Com ela, aprendi três coisas: Primeiro, é preciso se perguntar pelo que se quer ser lembrado. Segundo, isso deveria mudar quando se fica mais velho. Deve mudar com a própria maturidade e com as mudanças que vão ocorrendo no mundo. Finalmente, uma coisa pela qual vale a pena ser lembrado é pela diferença que se faz na vida das pessoas.

6-As coisas simples podem ser aprendidas

Estou contando esta longa história por uma razão muito simples. Todas as pessoas que conheço, que conseguiram permanecer eficazes durante uma vida longa, aprenderam as mesmas coisas que eu aprendi. Isto se aplica aos executivos e aos acadêmicos eficazes; aos militares graduados e aos médicos mais conceituados; aos professores e aos artistas. Sempre que trabalho com as pessoas, mais cedo ou mais tarde tento descobrir a que elas atribuem seu sucesso. Invariavelmente, contam-me histórias muito parecidas com as minhas.

E assim, uma resposta à pergunta : "Como o indivíduo, e principalmente aquele que executa um trabalho intelectual, pode manter sua eficácia?" seria: "Fazendo algumas coisas bem simples".
A primeira delas é estabelecer o tipo de meta ou visão que o Falstaff de Verdi me deu. Lutar sempre significa que se amadurece, mas não se envelhece.
Em segundo lugar, descobri que as pessoas que mantêm sua eficácia assumem a visão que Fídias assumiu de seu trabalho. Elas não estão dispostas a fazer um trabalho que seja apenas mediano. Têm respeito pela integridade de seu trabalho. De fato, elas se respeitam.
Estas pessoas têm mais um aspecto em comum: o aprendizado contínuo faz parte de seu modo de vida. Não se contentam em fazer o que faziam antes. O mínimo que elas exigem de si mesmas é melhorar, seja o que for que elas façam, e com mais freqüência se obrigam a fazê-lo de formas diferentes.
As pessoas que se mantêm vivas e crescendo também revêem seu desempenho no trabalho. Elas mantêm um acompanhamento dos resultados de suas ações e decisões, e os comparam com suas expectativas. Então, logo sabem quais são suas competências e quais não são.


7-A responsabilidade por si próprio

O mais importante de todas essas práticas é que os indivíduos, e principalmente as pessoas intelectuais, que conseguem se manter eficazes, e que conseguem continuar a se desenvolvendo e se modificando, assumam a responsabilidade por seu desenvolvimento e recolocação.
A responsabilidade pelo desenvolvimento do trabalhador do conhecimento, e por sua colocação, estou convencido disso, terá de ser assumida pelo indivíduo. Caberá ao indivíduo perguntar : de que tipo de atribuição preciso agora? Para que tipo de atribuição estou qualificado agora? Que tipo de experiência e que tipo de conhecimento e habilidade devo adquirir?
A responsabilidade pelo desenvolvimento do indivíduo precisa se tornar responsabilidade pelo autodesenvolvimento. A responsabilidade de colocação do indivíduo precisa se tornar responsabilidade pela sua autocolocação. Caso contrário, é improvável que pessoas com conhecimentos possam continuar eficazes, produtivas e capazes de crescer durante o longo período de vida profissional que agora podemos esperar.

Antônio Lourenço Jr. *(condensação)
* Engenheiro, Consultor e Instrutor em Gestão Empresarial

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